quarta-feira, 28 de maio de 2014

Como impor limites



Impor limites na medida certa deixa as crianças mais autoconfiantes e felizes 
A cena é clássica e, dependendo da intensidade, pode ser inesquecível. A mãe precisa ir ao supermercado e decide levar seu filho junto – porque a babá está de folga ou, simplesmente, por achar que a experiência vai ser bacana. Está tudo muito bem até que o pequeno pega uma enorme barra de chocolate. A mãe sabe que ele não costuma comer aquilo e devolve a guloseima à prateleira, explicando que naquele dia não dá para levar o doce. De repente, sem mais nem menos, a criança se atira ao chão, começa a rodar em círculos, gritar e chorar desesperadamente. E a pobre da mãe, sem saber o que fazer e com vergonha de todo mundo que assiste ao show, acaba levando o chocolate para que o filho pare de berrar.

Esse tipo de birra acontece com mais freqüência na faixa etária que vai dos 2 até os 5 anos e costuma desestabilizar até mesmo os pais mais calmos. Mas é importante levar em consideração algo de que a gente acaba se esquecendo durante o escândalo: muitas vezes, nossos filhos recorrem a esse tipo de estratégia como um meio para se comunicar. É que eles ainda não têm a aptidão verbal para dizer “Ei, mamãe, eu estou de saco cheio dessa compra. Será que nós podemos voltar outro dia?”. Daí, apelam ao artifício que parece mais fácil e eficiente para dizer logo do que precisam – abrir o berreiro. Na verdade, muitas vezes os pequenos estão pedindo inconscientemente ajuda para lidar com um sentimento novo e com o qual ainda não sabem lidar: a frustração de não ter o que querem na hora que querem.

“Manter-se firme nesses momentos é importante porque a criança só vai se acalmar quando estiver convencida de que fazer birra não adianta”, explica a psicanalista especialista em clínica infantil Silvana Rabello, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. “Assim, precisará lançar mão de outros artifícios para obter o que deseja.” É por isso que, numa situação dessas, o ideal é encerrar a compra, levar o filho para casa e, no caminho, explicar educadamente que aquele comportamento não é adequado. Não adianta dar o que ele quer nem ficar mais nervoso do que a criança. Afinal, os pais sempre são um modelo para ela. Se o incidente se repetir, o melhor é agir como antes e explicar que, da próxima vez, ela não vai ao supermercado porque não sabe se portar naquele tipo de ambiente. Ponto.

Criar limites modula o comportamento e ajuda a criança a desenvolver o respeito pelo outro, defende a psicopedagoga Wania Sorguiere, de São Paulo. “Aprender a aceitar o não é superimportante para moldar o humor do seu filho e fazê-lo entender, desde pequeno, que não se pode ter tudo”, diz a especialista. Para isso, é importante estabelecer algumas regras. Ninguém pode, por exemplo, interromper alguém que está falando, dar um tapa no rosto do colega, roubar o doce do irmão ou dizer palavras feias em público. Cabe aos adultos transmitir essas normas, por assim dizer, de conduta, além de garantir que elas sejam obedecidas em qualquer ocasião. Do contrário, o menino ou a menina vai entender que tudo aquilo não passa de um falatório momentâneo facilmente driblado por uma bela birra.

É claro que toda criança, assim como todo adulto, tem impulsos naturais de agressividade e precisa colocá-los para fora. Aí, são o pai e a mãe que vão lhe ensinar a fazer isso de forma saudável, durante as brincadeiras e jogos, por exemplo. “Os pais precisam ter bom senso na hora de ensinar à criança administrar os próprios desejos e não simplesmente reprimi-los”, ensina Silvana. A calmaria reina soberana ao longo do dia, quando a garotada sabe que vai descarregar toda a energia acumulada numa atividade recreativa.

A responsabilidade dos pais de servir como modelo na educação dos filhos é fundamental. Afinal, educar uma criança é educar um futuro adulto e cidadão. “O pai tem de entender que, se quer que seu filho seja respeitado pelos outros, terá que ensiná-lo a respeitar. Se deseja que ele seja persistente, precisa ensiná-lo a tolerar frustrações e por aí vai”, aconselha a psicóloga Vera Zimmermann, coordenadora do Centro de Referência da Infância e Adolescência da Universidade Federal de São Paulo. Uma criança bem preparada para ser um bom adulto entende, desde cedo, que existem outras pessoas no mundo e, se ela quer ser amada, vai precisar fazer também o que os outros esperam dela.

Por fim, tente se guiar por seus próprios instintos, mantendo sempre a calma diante de um show do seu filho no supermercado ou no shopping. Uma birra aqui, outra ali, sempre acabará acontecendo e isso é perfeitamente normal. Não tenha medo de dizer não. Pode ser difícil ver o pequeno chorar, mas tenha a certeza de que ele está aprendendo uma lição. No fundo, no fundo, a criança fica feliz e aliviada quando vê que existe alguém acima dela capaz de lhe dizer, em meio ao bombardeio diário de novidades, o que deve ou não fazer.

Na dose certa - Se o seu filho já passou dos 5 anos e continua fazendo muita birra, sente com seu marido ou sua mulher e converse sobre o que pode estar errado. Esse comportamento talvez esteja camuflando algum problema em casa ou até mesmo na escola.

- Não tenha medo de tomar atitudes que possam ser desagradáveis para você, mas necessárias para o aprendizado da criança. Ninguém gosta de colocar o filho de castigo, mas às vezes ele vai precisar desse momento, sozinho, para refletir sobre uma atitude malcriada ou algo do gênero.

- Esteja ciente de que você e os outros adultos que circundam seu filho servem de modelo para ele. Assim, a criança vai copiar alguns de seus atos primeiramente em brincadeiras, mas, em seguida, nas situações reais. Portanto, esqueça o ditado “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”. Ele pode servir para outras situações, mas nunca com seu filho.


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